Microplásticos contaminam até as áreas marinhas mais protegidas do Brasil
Foto: Naja Bertolt Jensen/Unsplash / 21 Oct 2021
Estudo internacional revela presença de partículas plásticas em santuários da biodiversidade, incluindo Fernando de Noronha e Abrolhos
As áreas marinhas protegidas do Brasil, consideradas santuários da biodiversidade nacional, não escapam da crescente poluição por microplásticos.
Uma pesquisa conduzida por cientistas brasileiros e australianos revelou que mesmo as unidades de conservação mais restritivas do país apresentam contaminação significativa por essas microscópicas partículas de plástico.
O estudo, publicado na revista científica Environmental Research, analisou a presença de microplásticos em áreas de proteção integral – as chamadas “no-takes” na literatura internacional –, que são as mais rigorosas em termos de restrição à atividade humana. Entre elas estão parques nacionais como Abrolhos e Fernando de Noronha.
Ostras e mexilhões como “sentinelas do mar”
Para detectar a contaminação, os pesquisadores utilizaram moluscos bivalves – ostras, mexilhões, amêijoas e similares – como organismos indicadores. Esses animais, que possuem conchas divididas em duas partes, foram escolhidos por funcionarem como verdadeiras “sentinelas do mar”.
“Eles se alimentam filtrando a água do mar através de suas brânquias, que funcionam como peneiras naturais”, explica a pesquisa. Durante esse processo, qualquer contaminante presente na água, incluindo microplásticos, fica retido no organismo dos bivalves.
Partículas predominantemente pequenas e escuras
Os microplásticos encontrados – partículas que variam de 1 mícron a 5 milímetros – apresentaram características consistentes ao longo de toda a costa brasileira: eram predominantemente pretos, brancos ou transparentes, e a maioria tinha menos de 1 milímetro de tamanho.
A análise química conseguiu identificar 59,4% das partículas coletadas. Os principais componentes foram:
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Polímeros alquídicos (28,1%): utilizados em tintas e vernizes, possivelmente originados de embarcações e barcos turísticos
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Celulose (21%): que pode ter origem natural (plâncton, algas) ou ser resultado de atividade humana (papel, papelão, restos de alimentos)
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PET (14%): comum em embalagens plásticas e fibras sintéticas, liberado durante lavagem de roupas e levado ao mar pelo escoamento urbano
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PTFE ou teflon (12,3%): presente em revestimentos antiaderentes e aplicações industriais
Os 40,6% restantes das partículas não puderam ser identificados pelos métodos utilizados.
Contaminação varia entre as áreas protegidas
O estudo revelou diferenças significativas nos níveis de contaminação entre as diferentes áreas marinhas protegidas. O Refúgio de Vida Silvestre do Arquipélago de Alcatrazes registrou a maior concentração, com 0,90 partículas por grama de tecido dos moluscos. Já a Reserva Biológica do Atol das Rocas apresentou a menor contaminação, com 0,23 partículas por grama.
Riscos para ecossistemas e cadeia alimentar
Os resultados da pesquisa evidenciam que a poluição plástica alcançou até mesmo os refúgios mais preservados da vida marinha brasileira, representando riscos potenciais para os ecossistemas e para toda a cadeia alimentar.
A descoberta reforça a necessidade de medidas mais eficazes de controle da poluição plástica, mesmo em áreas consideradas altamente protegidas, demonstrando que a contaminação por microplásticos é um problema que transcende fronteiras e sistemas de proteção ambiental.
Referência:
Microplastic contamination in no-take Marine Protected Areas of Brazil: Bivalves as sentinels
Beatriz Zachello Nunes, Victor Vasques Ribeiro, Clara Galacho Leal, Cherie Ann Motti, Ítalo Braga Castro
Environmental Research, Volume 273, 15 May 2025, 121231
in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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